segunda-feira, 9 de novembro de 2015

a palavra

"Deve-se escrever da mesma maneira como as lavadeiras lá de Alagoas fazem seu ofício. Elas começam com uma primeira lavada, molham a roupa suja na beira da lagoa ou do riacho, torcem o pano, molham-no novamente, voltam a torcer. Colocam o anil, ensaboam e torcem uma, duas vezes.
Depois enxáguam, dão mais uma molhada, agora jogando a água com a mão. Batem o pano na laje ou na pedra limpa, e dão mais uma torcida e mais outra, torcem até não pingar do pano uma só gota.
Somente depois de feito tudo isso é que elas dependuram a roupa lavada na corda ou no varal, para secar. Pois quem se mete a escrever devia fazer a mesma coisa. A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra foi feita para dizer."
por Graciliano Ramos

domingo, 7 de junho de 2015

Ode ao Desconforto

À desconfiança no início do mês,
À suspeita sobre a mais mansa das éguas,
À sobrancelha que levanta no pague-dois-leve-três,
Ao pé atrás sobre o mais translúcido dos copos d'água,
Gratidão!

Pela coceira no cangote da etiqueta mal-cortada
Pela pedrinha no calcanhar do sapato
Pela mão suja da caneta estourada
Gratidão!

Por ter me feito perguntar mais vezes
Por ter me feito não saber mais vezes
Por ter me feito procurar mais vezes

E que nenhum café quentinho
E que nenhum colo mais ninho
E que nenhum blusão mais fofinho
Me faça querer um só lugar.

Às cosquinhas da vida
Gratidão!

domingo, 10 de maio de 2015

feliz dia das mães

Parece que pra ser mãe, a galinha tem que vir antes do ovo.
E que, depois da escolha do galo certo, tem que crescer uma vontade muito grande, sincera e egoísta de ter alguém pra sempre, o que dá pro ovo aquela casquinha que quando se rasga faz aparecer lá de dentro a cria, a fruta: a filha e todas as coisas que realmente importam na vida dela e da galinha. Coisas essas bem mais inteligentes do que tudo o que cabe na cabeça e na razão dessas aves por aí, e que fazem com que os ovos se transformem em filhas cada - vez - mais galinhas. Até que de novo a gente se esqueça quem veio primeiro.
Feliz da galinha que colocou o meu ovo, manhêeeeee.

terça-feira, 10 de março de 2015

sair pra voltar

nem toda a lucidez do planeta ia me permitir perceber o que meu intercâmbio mudou em mim. porque o que eu trouxe tem a ver não só com a minha razão, que eu uso pra chegar às minhas conclusões mais sóbrias, mas também com os meus olhos que viram umas coisas diferentes, com a minha língua que sentiu gostos novos, com o meu coração que descobriu cantinhos inexplorados. talvez a coisa mais bonita de poder voltar seja mesmo só o fato de um dia ter se ido, e ter tido essa oportunidade me fez perceber que nada além das coisas-que-realmente-importam me importam, e que parar pra pensar nisso antes de tomar uma decisão é dar conteúdo pra vida.

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

quando é pra passar

tô com a impressão de que ele vai sumir. e vai ser mais um, que daqui uns tempos eu vou olhar pra trás e ter certeza de que "só não era pra ser", mas que amanhã eu vou olhar pra frente e me arrepender muito por mais uma vez não ter sido. e foi culpa minha. por insegurança, por carência, por engasgar de empolgação, por criancisse. ridícula.
minha vontade agora é de chamar perto e dizer tudo isso. mas parece que paira a esperança de que seja caso eu eventualmente consiga me demonstrar muito madura enquanto só deixo o tempo passar.
não sei. só muito medo de ter feito isso de novo. dessa vez de um jeito mais bizarro. depois de ter antecipado tanta coisa, de ter mandado tanta mensagem, de ter saído dois dias seguidos, de ter feito um sexo tão bom, de ter encostado na bicicleta. disso, malditas mensagens. disso, acho que o sexo foi bem melhor pra mim do que pra ele. disso, preciso desistir do whatsapp. disso, tô dolorida até agora.
que inferno. insegura. errada.
quando é pra passar,
não passa.