sábado, 24 de março de 2012

Uma Banda

"Coloque uma banda na rua e o povo a seguirá, para a festa ou para a guerra", um dia disse Napoleão Bonaparte. Ontem assisti a uma das grandes. Vestida em vermelho, branco, chapéus e trombones, fez-me lembrar meu passado. Eu tinha 17 anos, boas pernas e muitos amigos. No sábado, depois de um dia de trabalho, um cigarro ou outro, voltava pra casa. Em roupa nem tão nova e perfume economizado, partia para uma hora de bicicleta até o baile combinado. Num salão ou num cerco, com entrada barata, a banda da cidade tocava. Cinco homens que durante o dia trabalhavam em fábricas, à noite e nos fins de semana embalavam os passos dos solteiros da região. Um trombone, um contrabaixo, um saxofone, uma gaita de fole e um bulbo. Era onde os desacompanhados se encontravam para só e somente só - se divertir. Engraçado. Não conhecer, conversar, dançar uma ou duas, elogiar pouco, só se divertir. Naquele tempo, era tudo diferente. E tu, sabes bailar? De par? É uma coisa bonita, dançar. Hoje o mundo está envolto a máquinas. Eletrônicos, pessoas que dançam, com os braços pra cima. Mas uma coisa é ter quinze. Outra é ter vinte, outra trinta, quarenta. Outra bem diferente é ter setenta. Foi-se o meu tempo. Tua vez. Mas até amanhã.

domingo, 11 de março de 2012

O Grande Retângulo

Nasci e cresci nos arredores do bairro Bom Fim, em Porto Alegre. Passeava na Redenção aos domingos envolta a judeus barbudos, a moderninhos nativos da região e ao grande e retangular Colégio Militar de Porto Alegre, na época ainda vermelho com detalhes em bordô.
Até meus cinco ou seis anos, o prédio histórico nunca havia chamado a minha atenção. Vez ou outra meu pai comentava que tinha belas referências sobre a excelência do ensino do lugar, mas eu não queria saber, afinal do outro lado da rua tinha grama, areia e música – o que era muito mais interessante. Assim, desde cedo, uma curiosidade quase inconsciente sobre o Colégio foi plantada na minha cabeça. Em 2006 ela brotou. Eu tinha 10 anos e o gás da idade foi canalizado àquela plantinha que crescia forte, dia após dia, fertilizada pelo cursinho preparatório. Para entrar naquele mundo eu precisava passar por uma prova – de matemática, de português e de maturidade.
No final do mesmo ano, a planta virou árvore quando eu passei em todas as provas, uma a uma. As férias passaram voando, também não me lembro de nada, e em janeiro entrei no grande retângulo vermelho com um olhar diferente. Um misto de medo, posse e orgulho mexia comigo, me mantendo num nervoso ímpar que durou muito tempo. Tudo era novo e desafiador. Usar aquele uniforme quente com boina na cabeça, usar pronomes de tratamento, não podia mais usar meus tênis, minhas pulseiras e anéis coloridos. Era tão diferente que no início cheguei a acreditar que não aguentaria. Um mês ou dois se passavam e, pela frente, eu via mais sete anos.
Mas não foi assim. Pisquei. Minha árvore já tem vários galhos. Só me restam 2 (curtos) anos. Desde que entrei, passei muitas outras provas de matemática, português e maturidade e sei que ainda tenho várias a fazer pela frente. Breve entrarei no grande retângulo, que hoje é amarelo, com um olhar diferente: o olhar de uma ex-aluna que dentro do Casarão muito viveu e cresceu como planta, como cidadã e como mulher.