segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

subtropical portoalegrense

poesias, cortesias e fantasias a parte, não dá.
queria eu poder oscilar em tardes quentes e noites frias ou o contrário como ela faz. queria eu pouco me importar com o Brasil que sua o ano inteiro, com Gramado que neva em julho. queria eu conseguir dobrar sabe-se lá quantos milhões de habitantes em ares condicionados e guarda-chuvas, madames e hippies nada chiques, melissas e alpargatas. queria eu ter um sol que nasce e põe no melhor do brazilian summer time estando segura do meu charminho europeu.

domingo, 23 de dezembro de 2012

esquizo

por aí tenho visto demais.
cruel demais, egoísta demais, real demais. de tão perto, num choque, fui jogado pra longe, pra fora, no que eles chamam de psicose, no que leio como um novo contado com a realidade. o que eu vejo, cheiro, ouço, encosto, é cru. pra eles, delírios, heresias, alucinações, sinestesias, entre outros sufixos doentios, mas não: respeita. porque eu sei. que cego, tu amas um qualquer. que suicida, tu mergulhas em penhasco. que quase morto, tu sorris e aparentas poder começar. tudo de novo, mais uma vez.
do grego. skizo: cisão, separação. phrenos: mente.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

dos modernos

no meio do caminho

no meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha um pedro
no meio do caminho tinha uma pedra.

nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha um pedro no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

domingo, 28 de outubro de 2012

sensibiliza

cabelo desarrumado, sapato que não combina, etiqueta aparecendo. presente com preço, comida em boca aberta, calcinha em perna aberta. gordura de gordinha, pêlo em canela, espinha numa testa. unha descascada, anel virado, sapato desamarrado. não?
e crianças mal-educadas, famílias mudas, viúvas negras? o desvio dos olhos, a vergonha alheia, as caras-de-pau? hipócritas esclarecidos, imunes vitalícios, mimados protegidos? transportadores de boatos, inventores de histórias, mentirosos com talento. nada?
crianças com fome. adultos com fome. a fome. crianças doentes. velhos doentes. a doença. a solidariedade falha, o não ligo, a cegueira programada. os preconceitos herdados, as ofensas gratuitas, os enganos combinados. nada ainda?
cachorros atropelados, gatos abandonados, ratos foragidos. peixes com frio, macacos aprisionados, elefantes entediados. porcos ensanguentados? galinhas estupradas? patos mal-alimentados? agora sim.
priorize. o que te sensibiliza?

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

de verdade

gosto de gente de verdade.
feita de carne e sangue vermelho, claro ou escuro. que erra e pede desculpa, que faz e se arrepende, que abraça e beija e amassa, de verdade. saudável falta de prudência que faz a gente viver forte, que afasta a razão e libera o instinto do corpo, da dança, do grito, sem dó. julgando o julgamento como pouco importante, se esquecendo de que as pessoas lembram, ignorando que amanhã é um novo dia.
existem aos montes. tolidos, comportados, prudentes, felizes - se dizem. não sei. nasci sabendo que ser educada é um saco. segurar os talheres, alterar os pronomes, cruzar as pernas, sorrir. como quem se importa. com t o d a s essas coisas frias.
minha infanto-juvenil licença poética já pouco aceita entre a maioria acaba em pouco tempo. até uns anos atrás sempre tinha alguém a minha volta pra concertar qualquer observação sem-vergonha, über sincera, de verdade.
uma pena. vai expirar e só lamento. no mundo, de verdade, sou menos uma.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

algarismos significativos

A vazia exatidão dos números me faz procurar em décimos, em centésimos, um meio termo. Um infinito de elementos que sozinhos contam pessoas, balas, amigos, namorados, janelas, quando ao lado de uma vírgula, revelam nada mais do que o instrumento utilizado ou a qualidade do cronômetro. Ele sim, pra muito serve.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

toque pouco

percebi hoje que, no meu mundo, o sapato das moças já faz toc toc. que um sorriso já pode significar indiferença. que as frases que vem das crianças já devem ser consideradas valiosas e que um abraço apertado é um momento de toque. raro. entre eu e tu, dois pontos distintos, infinitas retas curvas estabelecem  o que chamamos de amizade, o contato. a viagem eletromagnética do olhar hoje já não tem a mesma importância do toque digital que, na velocidade da luz, digita o texto que eu posso ler ou não, que pode mudar ou não, que não ou não.
meus olhos cansam. de olhar e transitar por pixels e distâncias. por poucas íris e muitas teclas. por muito chão e pouca mão, unha, boca, pêlo. cor pouca. estímulo pouco. vida pouca. toque pouco.

sábado, 21 de julho de 2012

o chefe

precisei esperar pra ser atendida. o café era de graça. adocei e sentei, pra esperar.
olhei pra frente pra procurar a tela que mostrava as senhas, pra pensar se pagava mais um café, pra procurar gente bonita. vi várias mesas com seus computadores e, atrás de cada um deles, uma mulher muito bem maquiada e de bom humor, trabalhando. eram umas 8 atendentes pra uma demanda alta de clientes a espera de atendimento. ágeis, atendiam sem perder o sorriso ou a postura. adequadas, treinadas. bem mandadas.
no meio delas, vi um terno verde com calça social no mesmo tom. sapato de couro preto e gel segurando o cabelo lambido, para a esquerda. um homem, só um.
o chefe.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

entregue

a muito poucos me entreguei.
por medo, por conselho e por desconfiança, até hoje sempre começo com um pé atrás. afinal, um estranho ou quase sempre pode se transformar num novo amigo, num novo affair, num novo trauma, numa nova decepção.
tenho que parar com essas vírgulas.
a questão é que talvez eu demore demais pra quase tudo, sendo o tudo o que realmente interessa. a questão é que talvez eu tenha problemas não só em confiar, mas em demonstrar confiança às pessoas certas, que confiam em mim. a questão é que preciso aprender a me entregar - de verdade.
vou trocar de pingente. voltar a usar meu mergulhador. ele me faz lembrar disso toda vez que olho pro meu colo ou que, pra não encarar alguém, mordo minhas pratas.
outra questão que eu aprecio é a paciência.
gente que entende que eu vou devagar, que talvez eu não vá ao longe e que continua esquentando o chá, só no apoio moral, pra que eu chegue lá - pronta. sem o imediatismo do século vinte, com gosto de banho maria.
estou chegando.
já vou.

terça-feira, 26 de junho de 2012

todo dia

Todo dia acordo tarde o suficiente pra me atrasar, como e bebo o suficiente pra não enjoar. Com a mesma roupa e maquiagem me visto, pra ninguém comentar, caminho rápido pra ninguém suspeitar, ouço música no volume médio pros meus ouvidos não maltratar. Cumprimento e sorrio calma, de segunda a sexta, pra no sábado não acordar. Pra mais tarde voltar, caminhando rápido pra ninguém suspeitar, ouvindo música no volume médio pros meus ouvidos não maltratar. Pra comer e beber o suficiente pra só capotar e pra mais tarde acordar, pra quem sabe estudar, pra quem sabe alguma coisa tocar. Pra mais tarde comer e beber o suficiente pra só no outro dia voltar.. pra, com a mesma roupa, caminhar, ouvir, enjoar, cumprimentar, sorrir, capotar, comer, beber, estudar. Sem reclamar. Por todo dia poder acordar.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

um celular, um autógrafo e dois caderninhos

Não parei de escrever, é mentira - calúnia - blasfêmia.
Ganhei um celular e dois caderninhos.
O celular é uma nave que acopla, via internet, toda a minha vida nos âmbitos sociais e de localização, na eterna tentativa de sintetizar em palavras, notificações e fotografias o que se passa na minha cabeça.
Um caderninho é a memória que eu nunca tive, com rabiscos e desenhos confusos, íntimos e nada compreensíveis, que só me gastam clips e ponta de lápis 6B.
Já o caderninho da capa de Hamburgo é o teu substituto. Tenho escrito aleatoriedades, a caneta, nele. Ele começa com um mapa da cidade e acaba com as linhas de metrô. No meio tem folhas com linhas só de um lado. Embora branco e não tão magro, me conquistou, o moço.
Mas voltei. Pro infinito nada particular da internet. Sem pedir desculpas.
Só porque, no meio de um hambúrguer maior do que meus dedos, me pediram uma prova sobre a minha identidade seguida de um autógrafo. De um autógrafo.
Não, produção. Não pode.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Cores Pastéis

Crescem sequelados da vida. Passado fosco e cinza, numa imutável grayscale. Aos mais novos sugerem cor, CMYK, gramaturas e formatos. Eles crescem, livres, leves e soltos, demais. Embora avançados, dependem do família cinza para viver. A maioria, temendo perder o brilho, se afasta assustada. Eu nunca tive medo porque cresci sensata. Muito sensata. Em cores pastéis. Coloridas e acinzentadas. Do branco andei até o azul, quando me vi mudar. Não teve contraste pra segurar o brilho cuja escala subia vertiginosamente. Mas o cinza. Eu precisava do cinza. Tons de claros e escuros, vitais, não tive. Sozinha e clara fiquei. Sozinha e clara estou.
A chuva me acompanha.

sábado, 24 de março de 2012

Uma Banda

"Coloque uma banda na rua e o povo a seguirá, para a festa ou para a guerra", um dia disse Napoleão Bonaparte. Ontem assisti a uma das grandes. Vestida em vermelho, branco, chapéus e trombones, fez-me lembrar meu passado. Eu tinha 17 anos, boas pernas e muitos amigos. No sábado, depois de um dia de trabalho, um cigarro ou outro, voltava pra casa. Em roupa nem tão nova e perfume economizado, partia para uma hora de bicicleta até o baile combinado. Num salão ou num cerco, com entrada barata, a banda da cidade tocava. Cinco homens que durante o dia trabalhavam em fábricas, à noite e nos fins de semana embalavam os passos dos solteiros da região. Um trombone, um contrabaixo, um saxofone, uma gaita de fole e um bulbo. Era onde os desacompanhados se encontravam para só e somente só - se divertir. Engraçado. Não conhecer, conversar, dançar uma ou duas, elogiar pouco, só se divertir. Naquele tempo, era tudo diferente. E tu, sabes bailar? De par? É uma coisa bonita, dançar. Hoje o mundo está envolto a máquinas. Eletrônicos, pessoas que dançam, com os braços pra cima. Mas uma coisa é ter quinze. Outra é ter vinte, outra trinta, quarenta. Outra bem diferente é ter setenta. Foi-se o meu tempo. Tua vez. Mas até amanhã.

domingo, 11 de março de 2012

O Grande Retângulo

Nasci e cresci nos arredores do bairro Bom Fim, em Porto Alegre. Passeava na Redenção aos domingos envolta a judeus barbudos, a moderninhos nativos da região e ao grande e retangular Colégio Militar de Porto Alegre, na época ainda vermelho com detalhes em bordô.
Até meus cinco ou seis anos, o prédio histórico nunca havia chamado a minha atenção. Vez ou outra meu pai comentava que tinha belas referências sobre a excelência do ensino do lugar, mas eu não queria saber, afinal do outro lado da rua tinha grama, areia e música – o que era muito mais interessante. Assim, desde cedo, uma curiosidade quase inconsciente sobre o Colégio foi plantada na minha cabeça. Em 2006 ela brotou. Eu tinha 10 anos e o gás da idade foi canalizado àquela plantinha que crescia forte, dia após dia, fertilizada pelo cursinho preparatório. Para entrar naquele mundo eu precisava passar por uma prova – de matemática, de português e de maturidade.
No final do mesmo ano, a planta virou árvore quando eu passei em todas as provas, uma a uma. As férias passaram voando, também não me lembro de nada, e em janeiro entrei no grande retângulo vermelho com um olhar diferente. Um misto de medo, posse e orgulho mexia comigo, me mantendo num nervoso ímpar que durou muito tempo. Tudo era novo e desafiador. Usar aquele uniforme quente com boina na cabeça, usar pronomes de tratamento, não podia mais usar meus tênis, minhas pulseiras e anéis coloridos. Era tão diferente que no início cheguei a acreditar que não aguentaria. Um mês ou dois se passavam e, pela frente, eu via mais sete anos.
Mas não foi assim. Pisquei. Minha árvore já tem vários galhos. Só me restam 2 (curtos) anos. Desde que entrei, passei muitas outras provas de matemática, português e maturidade e sei que ainda tenho várias a fazer pela frente. Breve entrarei no grande retângulo, que hoje é amarelo, com um olhar diferente: o olhar de uma ex-aluna que dentro do Casarão muito viveu e cresceu como planta, como cidadã e como mulher.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Safari a Paris

Eu estava num safari. Pelo nível da aventura, pude observar que não era na África, mas sim num sítio ou coisa assim. Eu e a minha turma estávamos numa ponte feita de madeira e cordas que arrebentou. Só eu estava nervosa, não pela ponte, mas pelo meu atraso. Era quase três da tarde, eu já devia estar no aeroporto e minhas malas nem prontas estavam.
Meu celular caiu lá embaixo. Pedi emprestado para um colega, liguei pra mãe, disse que estava chegando. Despedi-me dos meus colegas, pisquei e cheguei numa casa, que não era a minha. Uma mala, que não era minha, estava em cima de uma cama, que não era minha. Abri um armário, que embora também não fosse meu, guardava minhas roupas de verão e inverno. Olhei no relógio e vi que não tinha tempo. Joguei tudo na mala, reservando um espaço vazio para os presentes no canto direito, em cima.
Minha irmã estava aflita. Já passava das três e dez e a gente tinha que sair. Pisquei e estávamos no carro, no estacionamento do aeroporto. Eu checava meu passaporte na minha frasqueira vermelha, que é minha. Pisquei e estávamos na sala de embarque. Não sei desde quando, mas eu sabia que a gente iria para Paris, eu e minha irmã. Pisquei e apareceu uma equipe, correndo. Disseram que não, nada de embarque, que estava tudo errado. Uma placa com um número foi colocada na minha frente e uma foto, com flash manual, foi tirada do meu rosto, me cegando.
Gritei que precisava da procuração, a procuração, aquela, que libera menores para viajar, sabe mãe? Meu pai tinha. A equipe foi embora. Entrei no avião. Minha irmã do meu lado.
Acordei.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Olhuda

Nasci com olhos grandes, escuros, iguais aos da minha mãe. Sempre ouvi isso de estranhos. Que lindos esses teus olhos de bolita. Que belo par de espelhos. Ó filha, teus olhos são muito grandes. Cresci e descobri que, se eu arregalasse, eles quase saiam para fora e, se eu os fechasse, poderia enxergar minhas pupilas através da brancura das minhas pálpebras. Cresci um pouco mais e descobri que eles podiam me fazer simpática. Cresci um pouco mais e descobri me fazia conhecer gente. Conversei com muitos estranhos até entrar no teatro, onde atuei para estranhos, com estranhos, sem estranhos, para mim. Cresci um pouco mais. Meus olhos mudaram. Depois de adicionada, camada por camada acima da minha retina, me fiz seletiva.
Cumprimentando muitos e confiando em poucos, saí do teatro e cresci mais um pouco. Ainda cresço pouco. Continuo olhuda.

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

white girl problems

Com dez anos, o colégio e o cursinho. Com onze me apareceram com uma porcaria chamada "sutiã". Com doze me apareceram com outra porcaria, chamada "absorvente". Com treze as espinhas e o aparelho, com quatorze o sexo oposto, com quinze percebi o futuro e agora, com dezesseis com uma coisa que eu ainda desconheço: emagrecer.
Porque nota baixa pra guri é malandragem, cueca a mãe compra, papel higiênico é o de casa ou nem isso. Espinhas só depois dos dezoito, aparelho é charme e o sexo oposto nunca foi problema. Futuro é consequência e gordura é masculinidade. Caso descorde com algum dos itens, é gay.
Isso tudo porque hoje eu saí pra comprar meia numa loja que vendia sutiãs lindos/caros e lembrei do no bra january. Porque até os 25 a gente até pode andar sem, mas não pega bem e porque depois disso, se opta pela dor ou pelo desconforto. Porque a história passa, as mulheres ganham cargos, dinheiro, direitos e continuam a procura do seu modelo de sutiã.